Um filme de amor

à beira do planeta marinha soprou a gente (2020) é um filme simples, que não se esforça para ser bonito. Apenas é.

O documentário soteropolitano à beira do planeta mainha soprou a gente (2020) já voejou para além das bordas e volteou por alguns cantos do Brasil. A obra de Bruna Barros e Bruna Castro participou do Festival Aruanda do Audiovisual Brasileiro, do Cachoeira DOC, da Mostra de Cinema de Ifé e do Panorama Internacional Coisa de Cinema, no qual foi premiado pelo júri oficial. Em fevereiro, chega como brisa doce –  feito cana mole, diria outra baiana – no oceano cinematográfico da Plataforma Cardume Curtas.

            Talvez menos autobiográfico – não há tentativas de se totalizar e circunscrever histórias pessoais – do que ensaístico – há, sim, um desejo pulsante de se reflexionar sobre as possibilidades de filmar e montar uma rede íntima de afetos –, à beira do planeta mainha soprou a gente parte das afabilidades sapatonas das duas Brunas, namoradAs, assim mesmo, com o “A bem desenhado”, arreganhado de maiúsculo. O documentário tece tateante, com seus diferentes registros audiovisuais, uma estética do aconchego. E nem sempre o quadro mais elaborado – e o filme tem muitos deles – é o mais acolhedor. A câmera de celular, por exemplo, pode vasculhar novas formas de enxergar o amor.

            à beira do planeta mainha soprou a gente também busca outras maneiras de verbalizá-lo. O texto é forte, esmiuce violências. Reivindica paixões completas e incondicionais. As Brunas pedem arrego, principalmente, às suas mães, com dificuldades de embalar e entender os seus desejos. As filhas não se contentam em ser amparadas “a despeito de tudo”, aspiram ao refúgio íntegro, ao reconhecimento pleno. Mas não há ressentimentos. Aliás, quer declaração mais garbosa de brandura e cuidado do que mandar pra mãe, que está distante, um vídeo de uma moqueca de banana da terra para aplacar a própria fome de colo?

            Toda ternura, porém, vai sendo entregue a conta gotas: de pouquinho em pouquinho, a candura aparece. Quando o documentário se inicia, aliás, não há como prever temáticas e intencionalidades. Ele começa com uma conversa despretensiosa sobre apocalipses zumbis – aos quais uma das Brunas diz não fazer questão de sobreviver – e com uma queima de fogos que, saberemos depois, anuncia outro tipo de fim de mundo. O espetáculo é prenúncio do Brasil bolsonarista, que haveria de tornar as vidas de várias Brunas mais difíceis. à beira do planeta mainha soprou a gente esbarra nessas adversidades, mas não se demora nelas. É um filme apesar das agruras, que haverão de ser superadas por amores tão bonitos e sinceros, feito festa de São João. Ainda soltaremos foguetes de esperança.

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