Mostra de Curtas no FRAPA – Festival de Roteiro Audiovisual de Porto Alegre – Parte II

#Crítica – Em setembro deste ano, o FRAPA realizou sua décima edição. Trago então alguns comentários sobre os filmes que compuseram a Mostra de Curtas do maior festival de roteiro da América Latina:

por Sarah Cafiero

UMA PACIÊNCIA SELVAGEM ME TROUXE ATÉ AQUI – roteiro de Érica Sarmet


Dirigido e roteirizado por Érica Sarmet, Uma paciência selvagem me trouxe até aqui contrapõe gerações e promove encontro. A protagonista Vange, interpretada pela Zélia Duncan, sapatão nos seus cinquenta e poucos anos, conhece numa boate um grupo de jovens lésbicas, que a intrigam com sua liberdade (ou coragem) de expor seus afetos. Preocupada e, de certa forma, maravilhada, Vange mergulha nessa realidade jovem, mas não completamente nova, tornando-se parte do grupo. O filme aborda solitude e coletivo, explorando as possibilidades da não-monogamia e fazendo um apelo à visibilidade, contra o silenciamento das diversas formas de se relacionar. Uma paciência selvagem me trouxe até aqui recebeu o prêmio de melhor título na 10ª edição do FRAPA.

ADÃO, EVA E O FRUTO PROIBIDO – Roteiro de R. B. Lima


Quinze anos após o nascimento de seu filho, Ashley (Danny Barbosa), mulher trans, pode finalmente exercer seu direito de ser mãe. O primeiro contato é tenso, marcado por desconfiança e receio, mas aos poucos, mãe e filho se encontram no cotidiano, construindo uma relação de afeto, que não supre uma privação de 15 anos, mas que se dispõe a ser presente e futuro. A estrutura de Adão, Eva e o Fruto Proibido traça um caminho gratificante, que desconstrói a habitual narrativa trágica e a reconstrói às avessas: o início tenso, que pode parecer prenúncio da tragédia, se desenrola numa afetuosa jornada de conhecimento e reconhecimento na construção da relação entre mãe e filho. O curta é dirigido e roteirizado por R. B. Lima e foi contemplado na última edição do FRAPA com os prêmios de melhor roteiro e melhor diálogo.

FANTASMA NEON – roteiro de Leonardo Martinelli


Mesclando documentário e ficção, o curta-metragem musical Fantasma Neon inova no formato ao trazer uma temática recorrente, porque necessária: a precariedade do trabalho dos entregadores de aplicativo. O filme, escrito e dirigido por Leonardo Martinelli, se passa durante a pandemia de COVID19, que escancarou ainda mais o descaso com os trabalhadores e a situação de insegurança que a falta de regulamentação propicia. Cantando as letras sarcásticas, os trabalhadores, invisíveis mesmo vestidos de neon, reivindicam condições mais justas e questionam a ideia de “trabalhar duro pra acabar bem no final”: “Bem pra quem?”

MANHÃ DE DOMINGO – roteiro de Bruno Ribeiro e Tuanny Medeiros

Às vésperas de um concerto importante, a pianista Gabriela (Raquel Paixão) é assombrada pela imagem da falecida mãe, que lhe dá as costas. Para se concentrar em sua música, ela precisa embarcar numa viagem contemplativa à casa de sua infância, em busca de se retratar com o passado.

Música e silêncio se unem em Manhã de Domingo para tecer uma trama sutil que diz de uma relação filial: imperfeita, mas fundamental na construção pessoal da protagonista. O roteiro é de Tuanny Medeiros e Bruno Ribeiro, que também faz a direção do filme.

AZULSCURO – roteiro de Evandro Caixeta e André Oliveira


Os primeiros minutos de Azulscuro tem tom de memória, e logo entendemos por quê: ao chegar em casa e desligar a música folk, a protagonista Sofia (Larissa Bocchino) se vê num segundo momento, mais sombrio e menos nostálgico,  quando deve lidar sozinha com o aniversário da misteriosa morte de sua irmã, Alice (Lavínia Bocchino). O terror começa quando um desconhecido tenta fazer contato pelo Instagram e Sofia precisa aceitar que a morte de Alice está ligada a causas sobrenaturais e seres demoníacos, que agora espreitam nas sombras atrás dela. O espectador acompanha tudo isso através do celular da protagonista: a câmera que capta fantasmas, a galeria com as lembranças da irmã e as redes sociais. O formato vertical, que nos limita a visão periférica, aflige. A trilha sonora se une às sombras e vultos para sustentar a tensão durante os 15 minutos de filme e sustenta. Azulscuro provoca calafrios. 

#Crítica

A curadoria da mostra competitiva de curtas do FRAPA 2022 foi realizada em parceria pela equipe da Cardume e do FRAPA.

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